8 de jun. de 2010

Futebol e cinema: melhores e piores

Fonte: Blog do Rubens Ewald Filho

No próximo mês, o Brasil inteiro, digo o mundo inteiro estará mergulhado na Copa do Mundo de Futebol da FIFA. Poucos filmes importantes irão estrear, e nossa vida, idas e vindas, serão condicionadas pelos horários dos jogos, os congestionamentos e as prováveis festas de vitória.

Não sou fanático por futebol, já contei várias vezes, mas sou de Santos, tenho cadeira cativa no Clube e tive a sorte de crescer vendo Pelé e aquele que foi o melhor time do mundo. O fato é que fiquei estragado, vi coisas que Deus duvida e não tenho muita paciência para assistir à coisa inferior.

Também vi muitos filmes sobre o assunto, inclusive brasileiros (O Craque, O Preço da Vitória) sendo que alguns deles estão hoje inacessíveis (eu gostei muito da primeira biografia do Pelé, O Rei Pelé, de Carlos Hugo Christensen, 1963). Infelizmente, temos poucos grandes filmes sobre o tema, daqui ou lá fora. Vamos lembrar de alguns dos melhores e piores, como sempre sem a preocupação de ser definitivo. Correções são bem-vindas.

Melhor documentário: Há muitos filmes do gênero, geralmente sobre craques (Zidane, Ademir da Ghia, Maradona, uma coletânea de seis DVDs chamada História do Futebol, os documentários vários e fracos sobre Corinthias e São Paulo, o legal Ginga a Alma do Futebol Brasileiro, e vários outros). Mas para mim, o melhor foi e ainda continua sendo Pelé Eterno, 2004, de D. Aníbal Massaini Neto. Narração Fulvio Stefanini.

Pelé Eterno
Foto: Divulgação

Minha maior emoção ao assistir a Pelé Eterno foi o choque de me dar conta de que eu estava lá, de que aquilo que parece fantástico sucedeu de fato. Que a lenda Pelé não é exagero ou fantasia. Finalmente temos a prova concreta e os pais podem mostrar para os filhos ou netos. Gostei da estrutura, das opções e do resultado. É claro que foi para mim e acredito para muita gente uma viagem sentimental a um passado mítico Pelé era realmente um jogador excepcional e o filme retrata isso fielmente. A lenda esta viva e merece respeito.

Menção honrosa nacional: Garrincha, Alegria do Povo *** (1963). Diretor: Joaquim Pedro de Andrade. Elenco: Heron Domingues (narrador).
Garrincha, Alegria do Povo
Foto: Divulgação

A vida do jogador Garrincha, quando ainda jogava no Botafogo, mas já era considerado um dos melhores do mundo. Ele morreria esquecido e decadente em 1983 (o que não é mostrado no filme). É um interessante registro de uma época e de uma certa estética. Começa sem narração (que depois é feita pelo mesmo apresentador do Repórter Esso, clássico do jornalismo, equivalente ao Jornal Nacional de hoje) mostrando a vida simples do famoso Garrincha, ainda em Pau Grande, com mulher e filhas. Não faz louvação do atleta, nem esconde suas falhas. Tem um texto poético de Armando Nogueira , famoso jornalista esportivo e depois diretor de jornalismo da Rede Globo. Como os arquivos cinematográficos eram precários por vezes temos apenas fotos. Mas o filme é bastante sensível e melhor do que parece.

Melhor filme nacional dramático: Boleiros - Era uma vez o Futebol, 1998. Diretor: Ugo Giorgetti. Elenco: Lima Duarte, Marisa Orth, Denise Fraga, Otávio Augusto, Adriano Stuart, Flavio Migliaccio, Cássio Gabus Mendes.

Boleiros - Era uma vez o Futebol
Foto: Divulgação

Em um bar na cidade de São Paulo, todas as tardes se reúne um grupo de ex-jogadores de futebol para relembrar suas glórias e contar casos curiosos. Fiquei muito emocionado ao assistir a este filme Boleiros )apelido dado a aqueles veteranos futebolistas que vivem falando do passado do esporte geralmente em bares), o melhor trabalho de Ugo Giorgetti. Alguns dos "causos" nem chegam a ter bem um final mas não importa. Todos vão acumulando sensações. Não apenas um amor ao futebol antigo, mas também o drama humano de pessoas que vivem do passado, que tiveram a glória e foram esquecidas, um crepúsculo dos deuses do esporte. Os atores amadores foram preparados por Fátima Toledo. Já a continuação Boleiros 2: Vencedores e Vencidos, 2006, com quase o mesmo elenco e estrutura, é bem mais fraca.

Outra menção honrosa nacional: O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias, 2006. Diretor: Cao Hamburger. Elenco: Paulo Autran, Caio Blat, Liliana Castro, Germano Haint, Michel Joelsas, Simone Spoladore, Daniela Piepszky. Em 1970, quando o Brasil luta para vencer a Copa do Mundo, o garoto Mauro, de 12 anos, tem que ficar com seu avô no Bom Retiro, bairro judeu paulistano quando seus pais tem que fugir porque estão sendo perseguidos pela Ditadura. Mas o avô morre repentinamente e os vizinhos abrigam o menino.



Um acerto do diretor Cao Hamburger com produção de Fernando Meirelles. Tem todas as qualidades que a gente admira no cinema argentino, embora seja muito brasileiro e também muito paulista. Muito ajudado por duas crianças muito bem escolhidas, o filme não insiste na política (Caio Blat faz um estudante universitário que conhece os pais dele) e nem na comédia de costumes. Também não exagera na alegoria do país que comemora as vitórias na Copa do Mundo ignorando as torturas e as prisões. Tudo faz parte de um painel muito bem orquestrado, sem sentimentalismo ou excessos. Fala diretamente ao coração e à mente.


Mais uma menção: Linha de Passe, 2008. O mais recente filme de Walter Salles, em parceria com Daniela Thomas, que deu o prêmio de melhor atriz em Cannes para Sandra Corveloni.



Com frieza e precisão, a dupla faz uma versão paulistana de Rocco e seus irmãos, passado na periferia e contando a história de uma mãe Cleuza e seus quatro filhos. Pensando como veículo para Vinicius, o menino de Central do Brasil, que cresceu e faz tudo para tentar conseguir se tornar jogador profissional de futebol, atormentado pelo fato de ter chegado a idade limite para ser aprovado em testes. É um universo cinzento, fechado, sem perspectivas. O filme não dá a alegria de um final feliz para a gente, o que o torna duro e por vezes difícil.

Meu cult nacional: Asa Branca, 81, de Djalma Limongi Batista.

Asa Branca - Um Sonho Brasileiro
Foto: Divulgação

Um dos raros filmes a mostrar as dificuldades de se tentar a carreira e o assunto tabu, o homossexualismo no futebol. Este foi o filme que revelou Edson Celulari, num belo trabalho com grandes momentos, como a sequência em que este joga futebol com o verdadeiro Garrincha no Maracanã. Tem ainda a ótima Eva Wilma, Walmor Chagas e Santos muito bem fotografada.

O pior filme brasileiro de futebol: A Taça do Mundo é Nossa, 2003. Diretor: Lula Buarque de Holanda. Elenco: Beto Silva, Bussunda, Claudio Manoel, Hubert, Helio de La Peña, Marcelo Madureira, Reinaldo,
Maria Paula, Deborah Secco.

A taça do Mundo É Nossa
Foto: Divulgação

Foram mais de dez anos planejando a estreia do grupo humorístico Casseta & Planeta no cinema. Mas nem parece. O roteiro é fraco, as piadas infelizes e de mau gosto. O resultado foi um inesperado fracasso de bilheteria apesar da forte campanha de marketing . Simplesmente não é engraçado como se podia esperar.

Menção desonrosa nacional: Garrincha – Estrela Solitária, 2005. Diretor: Milton Alencar Jr. Elenco: André Gonçalves, Taís Araujo, Marília Pêra, Miguel Falabella.

Garrincha - Estrela Solitária
Foto: Divulgação

A partir de sua decadência, quando já doente e alcoólatra, participa de um desfile de escola de samba, a história do Mané Garincha, famoso jogador de futebol carioca, dando ênfase especial a seu conturbado romance com a cantora Elza Soares. Decepcionante adaptação do polêmico livro. É um equívoco, tão precário que por vezes faz pensar nas antigas pornochanchadas (com grande número de cenas de sexo desnecessárias e gratuitas). Tão deficiente e irregular, que não fica nem o mito, nem o homem.

Melhor filme estrangeiro de ficção sobre futebol: O Milagre de Berna (Das Wunder Von Bern, 2003) Diretor: Sönke Wortman.

O Milagre de Berna
Foto: Divulgação

Em 1954, quando a Alemanha tem chances de ganhar a Copa do Mundo na Suíça, um ex-prisioneiro de guerra alemã volta da Rússia para reencontrar a família e tem problemas de relacionamento, principalmente com o filho mais novo, que é fanático por futebol e amigo de um dos jogadores da seleção. Um sucesso de bilheteria na Alemanha que não transferiu bem para aqui, porque há muitos detalhes que nos escapa. A ideia é misturar uma história fictícia (a de um garoto que é apaixonado por futebol e o pai que retorna e tenta se entender com a família) com detalhes absolutamente autênticos referentes à Copa do Mundo e à seleção da Alemanha. Não apenas nos jogos, mas também os que interpretam futebolistas são jogadores de verdade e assim por diante. Assim como o pai e filho no filme são assim na vida real. Ou curiosidade, como o criador das chuteiras Adi Dassler, que depois viraria Adidas. É obrigatório para quem gosta de futebol. Muito bem produzido e narrado, ganhou vários prêmios.

Outros filmes estrangeiros que eu curto:
Kung Fu Futebol Clube (Shaolin Soccer/Siu Lam Juk Kau, 2001). Diretor: Stephen Chow. Elenco: Stephen Chow, Vicky Zhao, Ng Man Tat.

Kung Fu Futebol Clube
Foto: Divulgação

Ex-jogador decadente se junta a um mendigo discípulo de Shaolin, para formar um time de futebol capaz de usar as incríveis habilidades ensinadas no templo e ganhar o campeonato nacional, contra um time comandado por um corrupto magnata. É curioso que justamente no país do futebol tenha sido fracasso.
Ainda mais em se tratando de um dos maiores fenômenos mundiais dos últimos tempos. Foi a consagração final de Stephen Chow, o rei da comédia de Hong Kong, que o levou depois a fazer outro êxito internacional Kungfusão (Kung Fu Hustle). Ele tem um humor simples e debochado, até meio chapliniano e conseguiu bater recordes de bilheteria na Ásia, numa história inspirada em desenhos animados de esporte (muito comuns por lá), onde os jogadores sempre são mostrados com superpoderes. No mínimo, é uma grande chanchada, até meio tosca mas que por isso mesmo é engraçada. Para quem não tem medo de rir de pastelão.

A Copa (The Cup, 1999). Um filme do Butão. do monge : Khyentse Norbu. Num mosteiro budista no Himalaia, dois jovens estudantes tentam escapar dos rituais para poderem seguir as finais da Copa do Mundo de futebol de 1998, em particular a final entre França e Brasil. Uma encantadora e original comédia, o primeiro filme feito no Butão, inspirada em fatos reais. Interpretada (muito bem) por amadores, construída lenta mas seguramente, com humor bastante sutil por um diretor que também é um Lama budista. Ele consegue passar com discrição sub-textos (a situação política, o conflito religião vida mundana, a miséria, a enorme popularidade do futebol em todo o mundo). Uma fita para ser descoberta que não chegou a ter o sucesso merecido.

Fuga Para a Vitória (Victory ou Escape to Victory, 1981). Diretor John Huston. Com Pelé, Sylvester Stallone, Michael Caine, Max Von Sydow.

Fuga Para a Vitória
Foto: Divulgação

O mais famoso filme de Pelé como ator, sendo dirigido pelo famoso John Huston. Em 1943, durante a Segunda Guerra Mundial, um grupo de prisioneiros de um campo de concentração alemão tem que enfrentar a seleção dos soldados, formando um time de futebol multinacional e com antigos jogadores famosos. O grupo, na verdade, pretende usar a chance para fugir do lugar. Ainda o mais importante filme feito pelos americanos sobre futebol (um esporte popularíssimo em toda parte, mas nem tanto nos EUA, onde é chamado de soccer). Acontece que não é um esporte fácil de ser filmado, e Stallone que não sabe de goleiro (mas o resto do time tem seus esportistas famosos na época também). Nada de excepcional mas para brasileiros uma fita e que costuma mexer com o orgulho nacional. Final decepcionante.

A procura de Eric (Looking for Eric) Ingl, 2009. Direção de Ken Loach. Com Eric Cantona, Steve Evets.
Simpática comédia sobre futebol, que traz a marca registrada de um diretor super importante: Ken Loach que, de marxista convicto, chegou até esta história que se propõe a dar uma lição de vida, a demonstrar que os pais podem deixar de ser ausentes e os erros do passado podem ser corrigidos. Ele deve ser apaixonado por futebol como a maior parte dos britânicos e admirador do jogador francês Eric Cantona, que jogou no Manchester United e ficou famoso também por suas frases misteriosas e alegóricas, seu mau humor (esta sempre de cara fechada) e seu talento.
Curiosamente, eu o conheci pessoalmente, fui apresentado a Cantona durante um jantar no México (aliás, ele foi muito simpático e atendeu muito bem um fã que estava conosco). Eric tem feito também muitos filmes como ator (acho que o mais notável foi Elizabeth, com a Cate Blanchett). Demonstra que tem senso de humor participando do filme sem moralismos (aparece fumando cigarro, muita maconha, bebendo e quase dançando).

Eric é utilizado aqui mais ou menos como Humphrey Bogart foi aproveitado em Sonhos de um Sedutor, de Woody Allen. Ou seja, é imaginado pelo herói também chamado de Eric e aparece em cenas imaginarias dando conselho ou ouvindo o herói se confessar ou se abrir (e de vez em quando trechos de gols ou jogadas famosas em cenas de arquivo).
Driblando o Destino (Bend it like Beckham, 2002), de Gurinder Chadha. Com Keira Knightley, Parminder K. Nagra, Jonathan Rhys-Meyers, Juliet Stevenson.



Jess, uma garota de origem indiana que vive na Inglaterra, sonha em jogar futebol mas a família é contra. Então faz isso às escondidas, o que leva eles a pensarem que virou lésbica.
Realizado por uma mulher de origem indiana Gurinder Chadha, fez inesperado sucesso de bilheteria nos EUA. É a melhor fita já feita sobre futebol feminino. A heroína é louca pelo jogador David Beckham (que faz ponta rápida e distante ao final). Uma comédia tradicional, que faz tudo como se deve e que revelou Keira Knightley (Piratas do Caribe).
Rudo e Cursi - A Vida é uma Viagem (Rudo Y Cursi, 2008) Diretor: Carlos Cuarón. Elenco: Diego Luna, Gael Garcia Bernal.



Dois irmãos mexicanos do interior sonham com fama e fortuna, Tato quer ser cantor e Beto, o mais velho e já casado quer ser jogador de futebol. Os dois são descobertos por um empresário argentino malandro que os leva para a cidade do México e os ajuda a fazer carreira, Beto como goleiro. Mas a fama lhes faz muito mal. O primeiro filme lançado pela firma Cha-Cha-Chá que é formada pelos três grandes do cinema mexicano, Guillermo Del Toro, Alejandro G. Iñarritu e Cuaron (aqui o filme é dirigido por seu irmão Carlos, que estreia no longa). Eles conseguiram reunir a dupla de E sua Mãe Também (dos Cuaron) num filme propositalmente brega. Uma sátira divertida que fala bastante sobre os bastidores do futebol.

Penalidade Máxima (Mean Machine, 2001), de Barry Skolnick. Com Vinnie Jones, David Hemmings.

Penalidade Máxima
Foto: Divulgação

Um famoso jogador de futebol inglês que teve sua carreira arruinada com suspeita de suborno vai para a prisão por esmurrar um policial. Para conseguir sobreviver por lá, aceita a pressão do diretor local para fazer um jogo de futebol entre os presidiários e os carcereiros. Passou em branco aqui este filme britânico estrelado pelo famoso jogador de futebol local Vinnie Jones (famoso pelas fitas Jogos, Trapaças e Dois Canos Fumegantes e Snatch – Porcos e Diamantes). Refilmagem do famoso Golpe Baixo (The Longest Yard, 1974, de Robert Aldrich, Burt Reynolds), que tem história semelhante, só que em prisão sulista e o esporte era o futebol americano. Aqui é o Soccer, o nosso futebol e o resultado é bastante divertido.

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