10 de jun. de 2010

Crítica: Red Dead Redemption

Nenhum período histórico tão breve rendeu tantas produções culturais quanto o Velho Oeste Americano. A era dos cowboys durou de meados de 1800 a 1920, o fim da Revolução Mexicana, representando a conquista e o desbravamento de toda a fronteira sul e ocidental dos Estados Unidos em formação. Tanto aconteceu em um espaço de tempo tão exíguo que a intensidade desse momento gerou seu próprio gênero. Nunca 70 anos renderam tantas histórias.

O cinema, a literatura e a televisão aproveitaram-se com entusiasmo das ideias do oeste selvagem, terra sem lei, de homens fortes e perigos naturais, e o público consumiu esses produtos com voracidade. Mas o excesso de produções, facilitadas pelo baixo orçamento do gênero, nas décadas de 1930, 40 e 50 exauriram o faroeste, que encontrou ainda algum fôlego nas décadas de 1960 e 70, primeiro em uma fase revisionista, depois com histórias mais irônicas e violentas, em que seus anti-heróis eram reflexos do revolucionário radicalismo cultural.

Nos anos 1980 em diante, contam-se nos dedos os grandes westerns surgidos. Daí o fato de não existirem muitos grandes games do gênero. Afinal, conforme a era em que a cultura era dominada por pistoleiros chegava ao fim, começava a popularização dos videogames - e o cowboy cedeu seu espaço aos space marines...

Um dos bons jogos de Velho Oeste é Red Dead Revolver, de 2004 para PlayStation 2 e Xbox. O jogo de tiro em terceira pessoa levou aos games um dos subgêneros mais apreciados do estilo, o chamado Bang Bang à Italiana ou Western Spaghetti, com direito a influências do mestre do gênero, o cineasta romano Sergio Leone (1929-1989), e trilha sonora com clássicos inconfundíveis de Ennio Morricone.

Agora, chega às prateleiras uma verdadeira carta de amor dos games aos westerns. Red Dead Redemption, que a empresa chama de sucessor "espiritual" de Red Dead Revolver, mantém a ambientação spaghetti do primeiro título da Rockstar no gênero e a cerca com possibilidades dignas de um Grand Theft Auto IV.

O jogo segue o estilo sandbox de GTA. Há as missões principais, que levam a trama à frente, as paralelas, que servem para dar dinheiro e fama, e também os objetivos-relâmpago. Esse último tipo é uma benvinda novidade e requer raciocínio rápido. Você pode estar cavalgando pelo campo ou andando em direção a uma missão em uma cidade quando alguém aparece gritando com um problema. Resolvê-lo normalmente exige muita velocidade e reflexos... já que o desfecho normalmente acontece em segundos e não raro a vida de alguém está, literalmente, por um fio (ou corda de enforcar).

Além dessas possibilidades, há os desafios de caça, sobrevivência e como caçador de tesouros. Todos eles aumentam a fama e seus frutos (peles, plantas, chifres, carne...) podem ser vendidos mais tarde. Enfim, há uma enorme gama de atividades e não faltam também jogos de azar, duelos, trabalho nos ranchos e recompensas a serem cobradas depois de localizar um bandido procurado. Com tanto o que fazer é difícil ficar entediado jogando Red Dead Redemption - mas se for o caso você pode participar da comunidade online gratuita Rockstar Social Club para desafios e rankings adicionais.

Como nos melhores jogos do gênero, cada ação tem sua reação: faça o bem e sua honra aumenta, comporte-se como um fora-da-lei e aguente as consequências em uma sociedade que tenta estender ao Oeste selvagem as maneiras do leste civilizado.

Tecnicamente, as tecnologia do engine Rage e o simulador de física para corpos Euphoria, empregadas no jogo, nunca pareceram funcionar tão bem. Uma novidade na jogabilidade, o sistema de mira Dead Eye, uma câmera lenta temporária que dá ao jogador os reflexos de um pistoleiro treinado, permite que seja apreciada a qualidade do Euphoria: partes diversas de humanos ou animais reagem como esperado quando atingidas por balas. É possível, por exemplo, desarmar um inimigo para depois, enquanto ele tenta pegar a arma do chão, laçá-lo e amarrá-lo. Entregar um criminoso vivo, afinal, sempre rende mais dinheiro.

Mas o que realmente emociona em Red Dead Redemption é a qualidade dos cenários e a preocupação em retratá-los não de maneira realista, mas com a atmosfera cinematográfica dos westerns das telonas. Ao primeiro sinal de perigo, começam os assobios da música, o lamento das gaitas e o dedilhar dos bandolins. Acompanhados pela trilha sonora, disparos passam rasgando com a sonoplastia consagrada dos bang bangs italianos, tudo isso enquanto o sol se põe por sobre uma colina desértica de onde fogem coiotes e bolas de feno passam ao longe... o universo do game é um dos mais ricos e interativos já criados nesse meio.

O multiplayer não foi esquecido e tem agradado os fãs dos jogos em rede. Há modos competitivos e cooperativos clássicos para até 16 jogadores, sendo que um deles, o Free Roam tem atraído atenção. Nele, até 16 pessoas podem juntar-se para explorar o mapa single player na íntegra. É possível formar bandos e aterrorizar vilarejos, fazer cumprir a lei contra grupos de criminosos, correr atrás dos amigos para um bom e velho tiro na cabeça ou simplesmente vagar pelas pradarias, observando o cenário e conversando. A cada desafio, missão ou objetivo conquistado ganham-se pontos que podem ser usados para destravar personagens, modos, cavalos...

O único pequeno problema - ainda que esteja sendo sanado através de arquivos para download - são os bugs visuais que arrancam temporariamente do jogador qualquer imersão obtida. Mais de uma vez uma casa de fazenda tornou-se invisível, por exemplo, mantendo apenas os contornos de portas e janelas, ou o cavalo do protagonista conseguiu ficar entalado em um detalhe da paisagem. Nada que não desse pra arrumar forçando o controle para um lado ou outro... mas ainda assim talvez o produto pudesse ter ficado mais um ou dois meses na Rockstar para polimento antes de ser colocado à venda. De qualquer maneira, um problema menor para uma experiência marcante, que deve deixar lembranças tão duradouras quanto os melhores momentos de um Leone, Ford ou Hawks.

Fonte: Omelete
Autoria: 
Érico Borgo

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