13 de mai. de 2010

Crítica: Zumbilândia

George A. Romero deu aos zumbis sua mais preciosa contribuição ao cinema: a metáfora social. Desde que A Noite dos Mortos Vivos (Night of the Living Dead, 1968) estreou, os defuntos ambulantes nunca mais foram os mesmos.

Os dentes podres desejosos de carne humana fresca já faz tempo que não são as maiores armas da morte encarnada. É o medo que eles instilam o que causa mais estrago - e o que os sobreviventes fazem com esse sentimento. Oportunismo, covardia e a eterna busca por poder numa sociedade em ruínas estão sempre presentes onde existem essas criaturas decompostas.

O Despertar dos Mortos (Dawn of the Dead, 1978) levou essa ideia um patamar acima, incluindo ácidas críticas à sociedade de consumo. Praticamente todo filme de zumbi desde então aproveitou esses parâmetros estabelecidos pelo cinema de Romero.

O que o diretor estreante Ruben Fleischer e os roteiristas Rhett Reese e Paul Wernick criaram em Zumbilândia (Zombieland, 2009) não foge à regra. Os zumbis obecedem à cartilha romerista - os tiros na cabeça, a infecção via mordidas e a eterna fome -, mas agrega aos monstros a velocidade e a explosão empregadas pela primeira vez em Extermínio (28 Days Later, 2002) e o humor negro que Edgar Wright já havia explorado em Todo Mundo Quase Morto (Shawn of the Dead, 2004).

Porém, se à primeira vista Zumbilândia parece apenas mais um filme que recicla conceitos, basta passar pela introdução para entender que se trata de uma produção que merece figurar na seleta lista de melhores de um gênero cada vez mais cultuado.

Logo na cena de créditos iniciais, Fleischer abre fogo com seu arsenal de estilo. Emprega uma câmera lentíssima de alta definição - digna de Discovey Channel - para mostrar cenas de perseguição entre zumbis e seus lanches. As sequências são lindas de ver e engraçadíssimas pela situação. Não é só mais um filme de morto-vivo que se anuncia, obviamente.

A trama acompanha o jovem nerd Columbus (Jesse Eisenberg), ex-jogador de videogame solitário, virgem, que só sobreviveu ao holocausto zumbi porque continuou fazendo nele o que sempre fez melhor: se esconder atrás de suas regras rígidas. Já Tallahassee (Woody Harrelson) é o oposto, não tem medo de nada e é o melhor naquilo que faz: matar mortos de vez. Em um mundo pós-apocalíptico, Columbis e Tallahasse formam uma dupla perfeita de sobreviventes... até descobrirem que existem outras pessoas, as irmãs Wichita e Little Rock (Emma Stone e Abigail Breslin), ainda mais preparadas que eles para a vida nesse ambiente inóspito.

Harrelson está impagável, dominando o elenco afiadíssimo. Já Stone e Eisenberg dão ao filme um tom de Superbad - ela estava no filme de Greg Mottola; ele simplesmente se parece demais com Michael Cera (e até interpreta no estilo do ator). A ação é coreografada com competência e de maneira caricatural, o que funciona muito bem, lembrando até games como Left 4 Dead e Dead Rising (Tallahasse improvisa armas e tem verdadeiro prazer em testá-las nos zumbis). Completa o tom descontraído uma inspirada trilha sonora (Velvet Underground!) e a participação mais que especial de Bill Murray, que recebe uma honesta e carinhosa homenagem dos cineastas no filme.

Em última instância, porém, nada disso seria suficiente para colocar o filme ombro a ombro com outras pérolas do cinema desmorto. É no inédito prazer do grupo de enfrentar a situação que encontramos o maior mérito de Zumbilândia.

O título de parque de diversões não é por acaso. Se Romero critica a sociedade e a humanidade em seus filmes, Fleischer, Reese e Wernick buscam aqui o otimismo, a vontade de seguir mesmo que na pior situação. É um ângulo novo para o gênero. Em uma cena específica, os protagonistas até mesmo extravasam suas tensões arrebentando uma loja de artigos nativo-americanos, ato cheio de significados. É o fim do politicamente incorreto, a desordem social é a norma, divertir-se é parte da experiência de seguir vivo. Romero deve estar orgulhoso.

Fonte: Omelete
Autor: Érico Borgo

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